O que diz o CID-11?
A Classificação Internacional de Doenças (CID-11) é a 11ª edição do sistema de classificação da Organização Mundial da Saúde (OMS), utilizado globalmente para padronizar diagnósticos médicos e estatísticas de saúde. Publicada oficialmente em 2018 e em vigor desde janeiro de 2022, a CID-11 substitui a CID-10, trazendo avanços na categorização de doenças, transtornos mentais e outras condições de saúde.
Este sistema é amplamente usado por médicos, pesquisadores, seguradoras e formuladores de políticas de saúde para registrar, analisar e comparar dados epidemiológicos em diferentes países. Além disso, influencia diretamente no planejamento de políticas públicas, na cobertura de planos de saúde e na definição de diretrizes para diagnóstico e tratamento de diversas condições médicas.
Objetivo e Importância da CID-11
A CID-11 tem como principal objetivo padronizar a nomenclatura e a codificação das doenças em nível internacional. Suas principais funções incluem:
- Facilitar o diagnóstico e tratamento de doenças e transtornos;
- Aprimorar a coleta de estatísticas de saúde pública, auxiliando na formulação de políticas globais;
- Fornecer um sistema padronizado para comunicação entre profissionais da saúde de diferentes países;
- Apoiar a pesquisa médica, permitindo comparações epidemiológicas e clínicas em nível mundial;
- Regular reembolsos de seguros de saúde e diretrizes de cobertura médica.
A CID-11 apresenta um formato digitalizado e mais flexível, permitindo atualizações contínuas conforme novos avanços científicos surgem, o que a torna mais dinâmica do que suas versões anteriores.
Principais Mudanças na CID-11
A transição da CID-10 para a CID-11 trouxe várias alterações significativas, incluindo novas categorias diagnósticas, reformulações de termos e uma estrutura mais moderna. Entre as principais mudanças, destacam-se:
1. Reestruturação do Sistema de Codificação
A CID-11 apresenta uma codificação alfanumérica mais detalhada e organizada, permitindo uma classificação mais precisa das doenças. Além disso, o sistema digitalizado facilita buscas e atualizações em tempo real.
2. Transtornos Mentais e Comportamentais
A seção de transtornos mentais foi amplamente revisada para refletir os avanços científicos mais recentes. Algumas mudanças importantes incluem:
- Inclusão do Transtorno do Espectro Autista (TEA) como uma categoria única, eliminando distinções como Síndrome de Asperger e Transtorno Invasivo do Desenvolvimento;
- Reclassificação do Transtorno Bipolar e da Depressão, permitindo uma abordagem mais detalhada sobre seus subtipos e gravidade;
- Transtornos Relacionados ao Uso de Substâncias agora consideram tanto o uso nocivo quanto a dependência, facilitando um diagnóstico mais preciso.
3. Reconhecimento do Transtorno do Jogo Eletrônico
Uma das mudanças mais debatidas na CID-11 foi a inclusão do Transtorno do Jogo Eletrônico, definido como um padrão de comportamento persistente e recorrente de jogos digitais que compromete a vida pessoal, profissional e social do indivíduo. Essa inclusão reflete preocupações crescentes sobre o impacto dos videogames na saúde mental.
4. Reclassificação da Incongruência de Gênero
Na CID-10, a incongruência de gênero era categorizada como um transtorno mental. Na CID-11, essa condição foi realocada para a seção de condições relacionadas à saúde sexual, retirando-a da lista de transtornos psiquiátricos. Essa mudança tem um impacto significativo na redução do estigma e na defesa dos direitos das pessoas transgênero.
5. Inclusão da Síndrome de Burnout
A Síndrome de Burnout, antes descrita de forma vaga, agora é reconhecida como um fenômeno ocupacional relacionado ao estresse crônico no trabalho, com três dimensões principais:
- Exaustão extrema;
- Sentimento de ineficácia e despersonalização;
- Redução da eficácia profissional.
6. Transtornos do Sono
A CID-11 reformulou a classificação dos transtornos do sono, separando-os em três grandes categorias:
- Transtornos primários do sono, como insônia e apneia;
- Transtornos do sono relacionados a condições médicas;
- Transtornos do sono relacionados ao ritmo circadiano, como a síndrome do atraso de fase do sono.
7. Novas Categorias Relacionadas à Medicina Tradicional
Pela primeira vez, a CID-11 inclui um capítulo dedicado à medicina tradicional, reconhecendo práticas médicas não ocidentais, como a medicina chinesa. Essa mudança busca integrar diferentes abordagens terapêuticas à medicina convencional.
8. Transtornos Relacionados ao Uso de Substâncias
A CID-11 aprimorou a classificação dos transtornos relacionados ao uso de substâncias, diferenciando entre:
- Uso prejudicial, que causa danos à saúde sem caracterizar dependência;
- Transtorno por uso de substâncias, caracterizado por dependência e padrões compulsivos de consumo.
9. Transtornos do Desenvolvimento Neurológico
Condições como TDAH e deficiências intelectuais foram reestruturadas, enfatizando um modelo mais dimensional e menos categórico, permitindo diagnósticos mais flexíveis e personalizados.
Críticas e Controvérsias da CID-11
Apesar dos avanços, a CID-11 também gerou críticas e debates entre profissionais de saúde. Algumas das principais questões incluem:
- Inclusão do Transtorno do Jogo Eletrônico: Alguns especialistas questionam se o vício em jogos eletrônicos deve ser tratado como um transtorno mental ou se seria apenas um sintoma de outros problemas subjacentes.
- Reclassificação da Incongruência de Gênero: Embora a retirada dessa condição da seção de transtornos mentais seja vista como um progresso na defesa dos direitos LGBTQ+, alguns críticos argumentam que isso pode dificultar o acesso a cuidados médicos para pessoas trans.
- Impacto da Medicina Tradicional: A inclusão de um capítulo sobre práticas tradicionais levanta preocupações sobre a padronização científica e a validação de abordagens que podem não ter respaldo em estudos clínicos rigorosos.
O CID-11 e a Saúde Pública no Brasil
No Brasil, a CID-11 já foi adotada pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e é usada em conjunto com o DSM-5, que é um guia mais específico para transtornos mentais. Sua implementação influencia diretamente em diagnósticos médicos, na formulação de políticas de saúde e na cobertura de tratamentos por planos de saúde.
Conclusão
A CID-11 representa um avanço significativo na classificação de doenças e transtornos, incorporando novas descobertas científicas e promovendo uma abordagem mais inclusiva e digitalizada. Suas mudanças refletem não apenas avanços médicos, mas também transformações sociais, como a despatologização da incongruência de gênero e o reconhecimento de novas condições de saúde mental.
Embora ainda haja debates e desafios na sua implementação, a CID-11 fortalece a capacidade global de monitoramento da saúde pública e melhora a padronização dos diagnósticos médicos. Seu uso contínuo e sua atualização digital garantirão que a medicina e a psiquiatria acompanhem as necessidades e realidades da população mundial.